por Luiz Jardim
As pesquisas de opinião sobre as eleições trouxeram um retrato que surpreendeu muita gente. Surpreendeu aquelas pessoas que têm tempo para se dedicar à curiosidade pela política e que, por descuido de humildade, acreditam que todos têm o mesmo hobby.
É preciso um afastamento prudente da própria visão da realidade para tentar compreender como tanta gente ainda tributa confiança a um candidato aprisionado após condenação criminal, segundo os princípios do estado de direito.
Para os que têm por hobby acompanhar a política, a primeira surpresa da pesquisa foi descobrir que os institutos de pesquisa incluíram o nome do condenado como concorrente à corrida presidencial. É possível imaginar que as pessoas, cujo dia-a-dia é somente dedicado para ganhar o pão de cada dia, não tenham tempo para acompanhar as consequências eleitorais produzidas sobre um cidadão condenado criminalmente.
A pergunta mais óbvia para os que acompanham a política nacional é: por que os institutos incluíram o nome de Lula, mesmo condenado? Disso podem resultar duas respostas. A primeira é que estejam também medindo outra coisa além da preferência eleitoral. A segunda talvez seja o ceticismo, a dúvida se o nome de Lula não estará na urna eletrônica no dia da votação, após a manifestação da Justiça Eleitoral.
Esse ceticismo é bastante razoável, por causa da época de Suprema Insegurança Jurídica em que o país vive, a partir de sinais emitidos pelas Cortes de Justiça de que preferem a iluminação dos tempos ao que vai escrito nas leis. Com interpretações que decretam os mais variados sentidos sobre o que vai claro nas normas, um instituto de pesquisa prudente pode imaginar que o entendimento do cidadão médio pode não ser hermeneuticamente tão óbvio para aqueles que sentenciam. Em função dessa insegurança, o melhor é deixar o nome do condenado na lista de candidatos a presidente.
Fora o lado formal das pesquisas com o cuidado de indicar todos os postulantes, o lado material da opção dos eleitores também surpreendeu as pessoas mais sintonizadas com as discussões políticas.
A surpresa surge com a pergunta: como pode um povo preferir um condenado por corrupção para governar um país, exatamente no momento da história, em que o combate aos desvios dos governantes é tão fortemente apoiado pela opinião pública? O senso comum mais simples diria que o problema do Brasil está com o povo, como piadas antigas contam.
Posiciono-me contrário à completude dessa explicação, lembrando que existem muitos mistérios do que é capaz a nossa vã filosofia justificar.
Parto de uma hipótese de que a preocupação com a política e com a direção do destino de todos está muito longe dos desejos imediatos das pessoas que precisam suar o rosto para ganhar o pão de cada dia. São pessoas, cujo foco está no sustento da família e também na conquista de alguma folga no orçamento doméstico.
Não vivem para ver funcionar abstrações sociais ou políticas. São pessoas que acordam e dormem cedo e não cultivam o hábito de manter discussões blasés sobre temas contemplativos. Julgam os dirigentes a partir daquilo de útil que lhes proporcionaram. O que elas querem dos políticos é que distribuam algo de útil e imediato.
Essas pessoas, que vivem o cotidiano com pressa e desconforto no transporte urbano, na trajetória para o trabalho, têm uma memória de que já viveram tempos melhores quando o ex-presidente condenado dirigia o País.
Mesmo sabendo que ele cometeu crimes, esse iconográfico povo também é informado sobre muitos outros políticos que estão envolvidos em outras transações. Graças à fama que as investigações trouxeram a algumas personalidades do mundo jurídico, mais personalidades foram criadas e atingiram quase todo mundo político.
Resultado: para esse povo que acorda cedo e viaja apertado nos ônibus, todo político é desonesto. Se todos foram igualados pela Lava-Jato, por que o povo seria culpado por escolher um deles, quando as opções de honestidade são raras no noticiário? Por que não escolher aquele que, na época em que foi Presidente, proporcionou a mais visível melhora da qualidade de vida?
Quem tem moral para recriminar um raciocínio utilitário como esse? A ética social, no sentido aqui empregado de norma de conduta, percebida pela sociedade, sempre acreditou que a finalidade do poder é arrumar a vida dos seus. Sempre desconfiou do sucesso alheio, reputando que a riqueza de um foi tirada do necessário de outro. Ora se sempre foi assim, não é surpresa que a maioria ainda prefira aquele condenado.
A preferência pelo antigo presidente condenado se reforça com a memória; ou pela concorrência dos fatos sobre ela. A questão criminal do candidato Lula é uma reminiscência coletiva de algo já antigo. As manchetes dos jornais trazem outros, que concorrem nessa competição, como o Presidente Temer, que sofre contínua pressão judicial com sucessivas prorrogações da investigação.
Aliada a isso, ainda temos a maior crise econômica do período republicano a ajudar a aumentar a preferência ao candidato condenado.
Para os que têm o hobby das análises políticas, fica claro a raiz da crise atual. Será que que devemos creditar àquele povo espremido nas conduções conseguir elaborar corretamente um raciocínio sobre a crise de hoje?
Para a maioria da população, a atual crise é consequência do governo de hoje. O que se sente hoje é a carestia; entretanto, poucas pessoas têm consciência de que a causa foi a desastrada política econômica implantada pela herdeira do demiurgo de Garanhuns.
Não é fácil entender que alguma decisão bastante equivocada tomada no passado pode provocar consequências por muito tempo. Não é fácil ver a consequência e apontar a causa. Tanto é assim que a antiga Presidente da República, destituída pelo Impeachment de 2016, lidera a preferência para o Senado em Minas Gerais.
Em política, o passado de meses se desvanece como a imagem que se tem do infinito. Sempre é mais fácil julgar o bombeiro do que lembrar do causador do incêndio.
Esse é o ambiente político eleitoral que vivemos hoje. Não é difícil conjecturar que o povo simples não dá muita importância à ética que esperam os idealistas da ação política.
Essas pessoas simples estão focadas apenas nelas e nas próprias famílias porque não progridem se perderem esse foco. Preferir um candidato apenas honesto não faz parte do senso prático de quem vive para sobreviver.
A questão formal da justiça sobre a elegibilidade do candidato condenado e a questão real da percepção social da política explicam por que o cenário eleitoral está tão confuso. Por um lado temos a insegurança sobre a viabilidade eleitoral de Lula; de outro, toda a estratégia do partido do ex-presidente para mantê-lo em foco.
Com base nesses cenários, é factível uma análise sobre a percepção de cada grande grupo. Um está surpreendido com a popularidade do condenado; o outro interpreta utilitariamente o valor do voto.
Talvez a síntese dessas duas teses esteja em alguém que consolide uma postura honesta juntamente com a vontade política de não retroceder nas questões úteis para os simples. Quem desempenhará esse papel? Precisamos entender os simples.